O Homem de Lagoa Santa
Tesouro arqueologico
Parente de Luzia
Tesouro Arqueológico
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Tesouro arqueológico

Repórter João Gabriel
Fonte:HOJE EM DIA

                  Um crânio humano e ossos da vértebra encontrados na Área de
                  Proteção Ambiental (APA) de Lagoa Santa, guardado a sete chaves
                  no Museu de História Natural da UFMG, no Horto, em Belo Horizonte,
                  são mais um subsídio para os cientistas brasileiros chegarem à
                  origem do povo americano.
                  Embora os estudos sobre as peças ósseas estejam paralisados,
                  possivelmente por falta de recursos financeiros, a expectativa é de
                  que sejam de um parente da moça batizada como Luzia, com idade
                  entre 20 e 25 anos e que teria vivido na região entre 11 e 13 mil
                  anos, cujo crânio foi encontrado em 1975 na mesma região e sido
                  noticiado somente em 1998. Seriam ossos de um povo que chegou a
                  Lagoa Santa depois de cruzar todo o continente a partir da América
                  do Norte. Ainda não se sabe se o crânio e os ossos da vértebra
                  sejam de uma mulher ou de um homem.
                  Quem encontrou o crânio foi a bioespeleóloga Lílian de Senna Horta
                  que realizava um trabalho de zoneamento ambiental da APA Casrte
                  de Lagoa Santa, pelo convênio entre o Ministério do Meio Ambiente
                  e dos Recursos Naturais Renováveis e a Companhia de Pesquisas e
                  Recursos Minerais (CPRM). Os levantamentos na região de Lagoa
                  Santa, descreveram em detalhes o meio físico, o meio biótico, o
                  patrimônio espeleológico, histórico e cultural, além do
                  sócio-econômico.
                  Um outro trabalho de levantamento da mesma região, que
                  compreende os municípios de Lagoa Santa, Vespasiano, Pedro
                  Leopoldo, Matozinhos e Funilândia, foi realizado pelo biólogo Sérgio
                  Tomich, hoje secretário de Meio Ambiente da Prefeitura de Belo
                  Horizonte. O projeto levantou as plantas remanescentes nas mais de
                  40 lagoas da região. Possibilitou deduzir a necessidade de resgatar
                  muitas espécies vegetais antes comuns e freqüentes na maioria das
                  lagoas e hoje encontradas em poucas delas e, assim mesmo,
                  inconstantes.
                  O inventário que permitiu a formação de um banco de espécies
                  vegetais possibilitaria às prefeitura da região resgatar as plantas, por
                  se tratar do berço da ecologia vegetal estudada, inicialmente, pelo
                  cientista Eugênio Warming, que fazia parte da equipe de pesquisas
                  do Dr. Lund.
                  Hoje, o que se vê são as lagoas cada vez mais assoreadas,
                  invadidas por quintais, poluídas por esgoto caseiro e coliformes de
                  animais que pastam em suas margens. Isto sem contar os restos de
                  minerações e gansos e patos que arrancam seus plânctons.
                  Como se vê, uma região de um valor histórico incomum, apesar de
                  toda levantada por cientistas internacionais, geólogos, biólogos e
                  engenheiros florestais, não vem merecendo a devida atenção
                  preservacionista. No maior manancial da região, que é a Lagoa
                  Santa, a destruição é generalizada. A partir do fechamento de seu
                  escoadouro, em 1979, na saída que forma o Córrego do Bebedouro,
                  o nível da água aumentou. Aos poucos, a água vai batendo nas
                  margens e retirando terra dos barrancos para dentro da lagoa. É
                  comum algumas pessoas lavarem seus carros nas margens e alguns
                  poucos visitantes deixarem ali pets e demais garrafas descartáveis
                  de refrigerantes e cervejas, além de outros lixos. Um esgoto
                  desemboca por entre árvores de jambolão, angico, pau d'óleo,
                  ingazeiro, gameleira e eucalipto. Um único coqueiro, remanescente
                  de vários outros, já está dentro da água. A Lagoa Santa e sua região
                  pedem socorro.


Enigmas calcificados

                  A equipe da bioespeóloga Lílian Senna, composta pela geóloga
                  Georgete Dutra e estagiários, fazia o mapeamento da Gruta do
                  Paredão da Fenda, no município de Matozinhos. A função da
                  bioespeóloga era detalhamento. Quando ela chegou à galeria da
                  gruta, também chamada de conduto, encontrou uma vértebra
                  superficial calcificada, ou seja coberta de calcito. Por entender que o
                  achado estava afeto à área de paleontologia, teve dúvida em pegar o
                  osso.
                  Como a gruta tem 300 metros de desenvolvimento e várias galerias,
                  a bioespeleóloga continuou seu trabalho. Pensando tratar-se de
                  parte das vértebras de um outro animal que não seja o homem, Lílian
                  entendeu que deveria pegar o osso, o que fez, pensando em enviá-lo
                  ao paleontólogo Castor Cartelle. Ao chegar na zona mais escura da
                  gruta, viu uma bola coberta por terra. Ao rolar a bola, percebeu
                  tratar-se de osso. Ao ver os órbitas dos olhos, percebeu tratar-se de
                  um crânio humano.
                  A mesma dúvida lhe voltou à cabeça, se deveria pegar ou não o
                  material humano que, nestes casos, só o arqueólogo deve pegar,
                  para não descaracterizar o sítio. Trocando idéia com os
                  companheiros de trabalho, o grupo decidiu que o crânio e a vértebra
                  deveriam ser levados para o arqueólogo André Prous, do museu de
                  História Natural da UFMG, o que foi feito. Antes dos ossos
                  calcificados serem passados ao professor, foram levados para a
                  CPRM, fotografados e depois enviados ao museu da UFMG.
                  Depois de terminado o trabalho espeleológico na região de Lagoa
                  Santa, Lílian Senna não voltou mais ao local, onde deveria ser feita
                  escavações para verificação do encontro dos demais ossos do
                  corpo humano e, até mesmo de outros corpos. A descoberta da
                  bioespeleóloga se deu em dezembro de 1995 e ela entende que
                  será necessária escavação na gruta para a busca de mais
                  fragmentos ósseos, o que ainda não foi feito.
                  Como a certificação de que o crânio da mulher que ganhou o nome
                  de Luzia tem de 11 a 13 mil anos e que pode ter sido um membro do
                  primeiro povo que habitou as Américas levou 23 anos, tudo indica
                  que o mesmo vá acontecer com o crânio e a vértebra achados por
                  Lílian e sua equipe.
                  Para o arqueólogo André Prous, pode tratar-se apenas de mais um
                  crânio humano. Ele ainda não faz qualquer ligação entre o achado e
                  a família de Luzia. Há dedução de que ainda não houve ou interesse
                  ou recurso para uma expedição à Gruta Paredão da Fenda, onde,
                  segundo Lílian, existem picoteamento, ou seja, figuras em baixo
                  relevo nas pedras. “São figuras parecidas com seres humanos",
                  disse. A fazenda onde se encontra a Gruta Paredão da Fenda é
                  propriedade particular.


Segredos

                  Os relatórios da APA Carste de Lagoa Santa, elaborados e
                  impressos pela CPRM e pelo Ibama não fazem referência ao crânio
                  e à vértebra encontrados em Matozinhos, por não estar comprovada
                  se pertencem a uma pessoa que viveu na região numa era entre 11 a
                  13 mil anos. É o que reconhece o superintendente da CPRM,
                  Osvaldo Castanheira. Isto não impede que, num futuro, haja o
                  reconhecimento que poderá ganhar importância internacional, como
                  se deu no caso do crânio de Luzia. A foto do crânio e da vértebra
                  está arquivada na biblioteca da CPRM, a exemplo de demais fotos
                  de esqueletos de outros animais, colhidas pelo arqueólogo Castor
                  Cartelle, durante o trabalho de levantamentos na APA Carste de
                  Lagoa Santa.
                  Antes de um trabalho mais detalhado de levantamento da região pela
                  CPRM e pelo biólogo Sérgio Tomich, um dos mais completos é o do
                  cientista Peter Lund e sua equipe. O escandinavo Dr. Lund é
                  considerado um dos papas da paleontologia do século passado que
                  encontrou em Lagoa Santa o abrigo para pesquisar, viver e morrer.


Em busca da harmonização

                  Ao explicar o zoneamento da APA de Lagoa Santa, o
                  superintendente da CPRM, geólogo Osvaldo Castanheira, afirmou
                  que constou do disciplinamento da ocupação urbana desse território
                  no sentido de harmonizar a parte econômica com o meio ambiente.
                  “O meio ambiente, de uma certa maneira, está aí para servir ao
                  homem, mas o homem não pode destruí-lo. Então há necessidade
                  que se tenha conhecimento do meio físico e sabendo das limitações
                  da natureza, as pessoas tenham condições de fazer o
                  desenvolvimento econômico, o desenvolvimento das populações,
                  gerar emprego e riqueza, mas sem destruir o meio ambiente", disse.
                  Apesar de algumas destruições praticadas nas áreas, por empresas
                  que não demonstram ter compromisso com a preservação da
                  natureza, os empresários da região de Lagoa Santa não se
                  opuseram aos trabalhos de pesquisa. Ao contrário, explica
                  Castanheira, “esse trabalho só foi possível a esse nível pela
                  aceitação dos empresários que não só permitiram a entrada em
                  suas terras e verificação das pedreiras, como também forneceram
                  documentos para complementação do projeto", disse.
                  Na opinião do superintendente da CPRM, o povo, de uma maneira
                  geral, é contra a mineração, supondo que tem algo errado. “A
                  mineração não é bonita. Às vezes tem um morro bonito e vem
                  alguém e decapeia aquilo para aproveitar o mineral. As pessoas não
                  conhecem de onde é que vem as coisas", disse.


Mineração para ser discutida

                  Na questão da mineração, o geólogo Castanheira afirmou que é
                  preciso que as pessoas entendam um pouco do sistema de causa e
                  efeito. “Se nós queremos uma panela de alumínio, é preciso minerar
                  a bauxita. Se queremos o cimento, é preciso minerar o calcáreo. Se
                  queremos o aço, vamos ter que minerar o ferro. Há necessidade de
                  compreensão. Ser contra a mineração, por ser contra, não tem
                  sentido. Teria sentido ser contra se a pessoa morasse na roça, em
                  rancho de sapé, tudo bem. Mas a primeira coisa que o pessoal faz é
                  andar de carro, é construir uma casa de alvenaria e depois falar
                  contra a mineração, aí fica complicado. Se chegamos ao
                  desenvolvimento em que estamos, deve-se a duas coisas básicas.
                  Uma é a mineração e a outra a tecnologia", disse.
                  A participação da CPRM no trabalho de detalhamento da APA de
                  Lagoa Santa se deve ao fato de ser uma empresa pública, vinculada
                  ao Ministério das Minas e Energia que tem como missão o
                  conhecimento da geologia e da hidrologia que é área subterrânea.
                  Faz o estudo do meio físico, de maneira que qualquer que seja o
                  investidor ou o controlador, os governos federal, estadual ou
                  municipal, ou investidor privado, possam saber onde está inserido.
                  Se na questão de um rio, saber a quantidade de água ou de
                  sedimento que está passando. Se for questão de água subterrânea,
                  onde obter a maior quantidade desta água ou onde furar. No caso da
                  geologia, sua função é indicar onde há probalidade de se obter os
                  diversos tipos de minerais, quer metálicos quer não metálicos.
                  As pesquisas feitas na região de Lagoa Santa se deram por se tratar
                  de uma APA federal, onde não existia legislação própria e nenhum
                  conhecimento do meio para que se pudesse disciplinar a ocupação
                  urbana e as atividades econômicas.
                  Sobre a possibilidade de os municípios da região terem assimilado
                  as pesquisas da CPRM, o superintendente explicou que a
                  companhia só faz o trabalho e o coloca em disponibilidade. A partir
                  daí, a fiscalização deveria ser feita pelo Ibama, a Feam e o próprio
                  município. “Os levantamentos estão feitos para que não ocorra
                  destruição ambiental, mas não sei dizer se está ou não ocorrendo",
                  finalizou.


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