MÁFIA DA NOTA FRIA
Audácia e confiança na impunidade

Grupo comprava empresas inativas para emissão de documento fiscal e acreditava que não seria descoberto

O esquema de acobertamento de mercadorias roubadas e de sonegação fiscal usado pela máfia da nota fria envolveu não somente pessoas que tinham conhecimento do golpe, mas outras que sequer imaginavam um dia ter que prestar depoimento na Justiça por estelionato ou inadimplência no pagamento de tributos. O bando mostrou audácia, comprando empresas inativas, colocando-as em nome de “laranjas” que perderam documentos pessoais ou que até mesmo já tinham morrido.

O ex-representante de vendas Ernani Renato Chaves, de 68 anos, dono de 49,9% das cotas da AG Metalúrgica Fischer, de Lagoa Santa, na Região Metropolitana de BH, é um dos envolvidos que assumiram conscientemente o papel de “laranja” de Evandro Torquette, dono de 50% da empresa. “As atividades estão paralisadas e hoje apenas alugamos os galpões para outras empresas. Sou uma espécie de cão-de-guarda do Torquette”, declara.

Tio do assessor parlamentar Jair Olímpio Júnior, ele alega que ficou desnorteado ao saber da prisão de Torquette como acusado de ser o mandante do assassinato do sobrinho. Jair também chegou a ter várias firmas registradas em seu nome pelo empresário. Na Ferrum Ltda, de Bocaiúva, o assessor teve sua última atuação como testa-de-ferro de Torquette. Um desentendimento entre eles pôs fim à “sociedade” e tornou-se o motivo de sua morte, segundo a apuração da Polícia Civil.

Em recente depoimento, Ernani revelou que ainda mantém contato com o acusado. “Até hoje, tento acreditar que Torquette não mandou matar Jair. Ele chegou a sentar comigo para almoçar, por mais de uma vez, depois do execução de meu sobrinho. Foi, inclusive, no enterro e abraçou a viúva e as filhas de Jair. Atualmente, mantenho apenas relações comerciais com Torquette, que, mesmo preso, me liga para saber como estão os negócios, ou seja, o pagamento do aluguel dos galpões”, conta, destacando que somente após o crime ficou sabendo do esquema de vendas de notas fiscais frias.
"Eu não sabia do esquema da venda de notas frias por parte de Torquette. Ele pôs a AG Metalúrgica Fischer em meu nome, sem que eu pagasse sequer um tostão a ele. Sou apenas uma espécie de cão de guarda. Nenhuma nota fiscal fria da Fischer foi emitida com o meu conhecimento. Acontece que o Torquette pegou pelo menos 100 notas fiscais da empresa em branco (onde aliás ainda consta o nome da Sidernox) e não sei o que fez com elas. Saí da sociedade da Ferrum exatamente porque temi irregularidades. Nunca sequer fui a Bocaiúva." Ernani Renato Chaves, “sócio-proprietário” da AG Fischer

fonte: jornal Estado de Minas de 01/junho/04 - caderno Economia