Água previne pedra nos rins
Cristiane Henrique aprendeu a gostar de água depois que sofreu
com uma cólica renal, que a obrigou a se submeter à uma endoscopia (Foto
Luiz Costa)
Luciana Neves
Repórter
As abomináveis crises de cálculo renal respondem por cerca de 300
atendimentos por dia nos pronto-socorros de Belo Horizonte, conforme o
urologista do Hospital Felício Rocho, Francisco Guerra. Considerada pela
medicina como a mais lancinante das dores, ficando na frente do enfarte
e da dor do parto, a incidência da cólica renal é mais freqüente no
Verão, observa o médico. O médico explica que, nesta época, há um
aumento natural da sudorese, provocando maior concentração de urina,
conseqüentemente, um depósito elevado de sedimentos nos rins e a
formação da litíase, popularmente chamada de pedra nos rins. O problema
atinge 7% da população brasileira e a proporção é de três homens para
cada mulher, principalmente entre os 20 e 50 anos.
Os cálculos renais podem ser prevenidos com a ingestão média de dois
litros de líquido por dia, sendo metade água. O indivíduo que forma um
cálculo uma vez na vida tem 50% de reincidir. “Isso acontece porque a
pessoa não corrige os hábitos que levaram à formação do problema",
observa. Diversas são as causas da doença, mas a baixa ingestão de ácido
cítrico, encontrado em frutas cítricas, é considerado o principal
motivo.
Também o consumo exagerado ou deficiente de cálcio pode desencadear a
formação de cálculo renal. Além disso, a elevação do ácido úrico na
urina; cirurgias extensas sobre o intestino alterando a absorção e
excreção de determinados alimentos; infecção por determinados germes e
hereditariedade podem ser causadores de sofrimento para muita gente.
Indivíduos de cor branca desenvolvem mais o problema do que os de outras
raças, embora não haja estudos que demonstrem o motivo.
A combinação de cerveja com churrasco, para quem têm pedra nos rins,
pode ser sinônimo de tortura. Isso porque a bebida promove maior
necessidade de urinar. Com isso, explica o médico, a pelve renal e o
ureter terão mais espasmos e, conseqüentemente, mais dor. Alimentos com
mais sal, como as saborosas carnes dos churrascos, requerem maior
ingestão de líquido e, portanto, aumento da diurese. “O sal também está
relacionado com alterações metabólicas renais, podendo ser fator de
interação com outros alimentos, propiciando a formação de cálculos",
explica.
O urologista afirma, entretanto, que não há necessidade de o paciente
apresentar dor ou algum sintoma para haver o diagnóstico de litíase e
conseqüente complicação. Os sinais estão relacionados ao tamanho e
localização do cálculo. Francisco Guerra explica que, se o cálculo
estiver situado no rim, o mais comum é a pessoa não sentir dor, mas pode
haver perda de sangue na urina e infecção no trato urinário. Já se a
pedra estiver localizada na pelve renal e ureter, o paciente geralmente
apresenta dor lombar, semelhante à uma cólica.
Mas se a pedra estiver no ureter médio para baixo ou mesmo próximo à
bexiga, a dor pode ser abdominal e provocar sintomas urinários,
simulando quadro de infecção. A pessoa vai urinar várias vezes em
pequenas quantidades (com dor ou não), ter sensação de querer urinar
várias vezes e de esvaziamento incompleto da bexiga, além da sensação de
querer evacuar. Há irradiação da dor, conforme o urologista, para a
região da genitália (vagina ou escroto) ou parte interna da coxa. O
médico explica que o sangue na urina acontece pelo traumatismo que o
cálculo gera na via excretora. “A dor se explica devido à contração do
ureter, no intuito de fazer a progressão da urina chegar ate a bexiga e
na tentativa de eliminar o cálculo".
Dor não depende do tamanho da pedra
Pacientes que possuem cálculos renais de até quatro milímetros de
tamanho conseguem eliminá-lo de forma espontânea; de cinco a seis
milímetros, 50% a 60% dos enfermos expelem sem necessidade de
tratamento; mas apenas 10% a 20% expulsam pedras maiores que seis
milímetros sem intervenção médica. “Não é possível fazer associação de
tamanho do cálculo com a intensidade da dor, pois pode haver uma pedra
com dois milímetros e a pessoa sentir muita dor, enquanto outra com um
cálculo bem maior não sentir nada", afirma o urologista Francisco
Guerra.
A pedra pode ser formada por diversas composições químicas - oxalato de
cálcio, fosfato amorfo, ácido úrico, cistina, entre outros produtos do
metabolismo do corpo, oriundos de fatores alimentares, doenças orgânicas
(problemas da tireóide, obesidade mórbida) e baixa ingestão de líquido.
Há quem acredita que o maior consumo de tomate, que possui oxalato, pode
fazer mal ao organismo. Mas a literatura médica prevê que essa
quantidade deve ser de 20 quilos diários para contribuir com a formação
do cálculo. “Só justifica-se a restrição de alimentos ricos em cálcio
para pacientes que foram estudados e apresentaram distúrbios de
metabolismo para o cálcio", ressaltou. Ele afirma que aqueles que
formaram um segundo episódio de cálculo renal têm indicação de estudo do
metabolismo urinário para definir os fatores causais.
Francisco Guerra orienta às pessoas, principalmente aos jovens, para o
cuidado com a utilização de anabolizantes ou produtos que tenham
macromoléculas de proteínas, pois propiciam a lesão do rim, podendo
promover a formação de cálculos ou mesmo distúrbios de funcionamento do
rim. “Isso é variável. Às vezes uma pequena dose pode não ser lesiva
para determinado organismo, mas ser altamente prejudicial para outro".
Mas existem três locais onde a pedra pode estacionar e intensificar a
dor - a junção da pelve renal com o ureter; vasos ilíacos (cruzamento de
vasos sangüíneos) e entrada da bexiga. “É muito comum paciente com dor
lombar de causa ortopédica procurar o consultório de urologia por ele
acreditar que a dor lombar é igual à causada pelo rim. O médico deve ter
segurança de que não há qualquer dor renal associada", afirma. Portanto,
é prudente que sejam realizados exames de imagem (ultra-som e raio-X) e
ter certeza de que não há qualquer problema urológico. Feito isso, o
paciente é encaminhado para o ortopedista para tratamento osteomuscular.
Local e dimensão indicam tratamento
Dor habitualmente de forte intensidade, que pode ser acompanhada de
náusea, vômito e perda de sangue na urina, na maioria das vezes
microscópica são os sintomas principais da cólica renal e sugerem o
diagnóstico. Quando associada à infecção, o indivíduo pode ter febre. O
urologista Francisco Guerra afirma que pacientes com indicação de
tratamento, mas sem dor, costumam banalizar a situação, postergando o
tratamento. No entanto, esse comportamento pode provocar conseqüências
desastrosas para o rim e o paciente necessitar inclusive de diálise.
Uma avaliação médica periódica pode mostrar a presença de infecção,
mesmo se o paciente não apresenta sintomas. Guerra afirma que 70% a 80%
dos cálculos são observados no raio X do abdômen. Associado ao
ultra-som, que permite visualizar dilatação ou outras lesões do rim, as
chances de diagnóstico sobem para 90%. Mas o exame mais completo é a
urografia excretora - uma série de radiografias utilizando contrastes,
que possibilita um estudo mais minucioso das vias urinárias e detecção
de pequenos cálculos não captados por métodos menos invasivos.
O tratamento está relacionado com a localização e tamanho do cálculo.
Pode ser conservador, quando a pedra tem até quatro milímetros e 90%
delas são expelidas espontaneamente, em até duas semanas, com aumento da
ingestão de líquido. Já a litotripsia extracorpórea, vulgarmente chamada
de laser, consiste na emissão de ondas acústicas ao longo do trajeto
urinário.
Ao localizar a pedra, as ondas emitidas pelo aparelho vão desestabilizar
a estrutura química do cálculo com conseqüente fragmentações. O
procedimento dura aproximadamente 40 minutos e a taxa de sucesso,
conforme o médico, é de 70% a 80% de fragmentação, para cálculos de
pelve renal e ureter proximal, e de 40% a 60% para ureter distal. A
partir daí, recomenda-se o consumo maior de líquido para promover a
eliminação das pedras.
Cirurgia tem 97% de sucesso
Outra possibilidade de tratamento é a ureteroscopia, quando o ureter é
acessado através de um aparelho endoscópico. A visualização é feita por
um monitor e o cálculo é retirado por inteiro ou fragmentado, conforme o
tamanho. “A grande vantagem é que o paciente faz o procedimento, com
taxa de sucesso de 97%, e já se vê livre do cálculo", afirmou o
urologista Francisco Guerra. A intervenção necessita de sedação ou
bloqueio raquimedular ou peridural. Ele observa que muitas vezes é
necessária associação de mais de um tratamento.
Também existe a cirurgia percutânea, que consiste na punção do rim com
uma agulha, seguida de dilatações no órgão até alcançar um diâmetro de
passagem para, com um aparelho nefroscópico, chegar ao cálculo e então
retirá-lo. A cirurgia convencional (aberta) é reservada somente para
casos em que não houve sucesso com as modalidades mais avançadas de
tratamento.
A dona de casa Cristiane Henrique Silva, 25 anos, submeteu-se à uma
ureteroscopia recentemente, depois de ter sido acometida por uma forte
cólica renal. O cálculo, com seis milímetros, estava localizado na
uretra. “Tomei bastante líquido e analgésico, mas a dor não passou. A
pedra foi removida pelo canal da urina, por endoscopia", afirma
Cristiane. O procedimento não interferiu em nada na sua gravidez de três
meses. “Antes não tomava muita água. Tinha dia que eu até esquecia,
acabava bebendo suco ou refrigerante. Hoje aprendi a gostar de água",
afirma.
Fonte: Jornal Hoje em Dia
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